A Justiça do Maranhão suspendeu o show do cantor Zé Vaqueiro, que custaria R$ 600 mil aos cofres públicos e seria realizado na última segunda-feira (29), em Turilândia, a 157 km de São Luís, durante a festa de aniversário de 31 anos do município.
A Prefeitura e a Câmara Municipal de Turilândia são alvo de uma investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco), do Ministério Público do Maranhão (MP-MA), o qual aponta que uma organização criminosa estruturada desviou recursos públicos no valor de R$ 56 milhões, principalmente das áreas da Saúde e da Assistência Social
A decisão liminar de suspender o show é do juiz José Ribamar Dias Júnior, em atendimento a um pedido do MP-MA. Também foram canceladas outras apresentações musicais previstas no evento. A setença foi proferida no dia 25 de dezembro, mas só foi divulgada nesta terça-feira pelo Ministério Público.
Além de Zé Vaqueiro, estavam programados shows da cantora gospel Isadora Pompeo, da Aparelhagem Carabão e da dupla Silvânia Aquino e Berg Rabelo. A Justiça proibiu a Prefeitura de Turilândia de realizar qualquer pagamento ou transferência financeira aos artistas.
Isadora Pompeo se apresentaria no dia 27. Já Zé Vaqueiro, Silvânia Aquino e Berg Rabelo - ex-vocalistas da banda Calcinha Preta - e a Aparelhagem Carabão estavam previstos para o dia 29.
O Ministério Público questionou o uso de recursos públicos em festas de grande porte diante das carências de políticas sociais no município. E também apontou investigações em andamento sobre supostas fraudes na gestão municipal.
Segundo a promotoria, apenas o cachê de Zé Vaqueiro custaria R$ 600 mil. Com gastos de estrutura e logística, o valor total do evento poderia ultrapassar R$ 1 milhão.
“O Município de Turilândia possui um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo (0,536), indicando a necessidade de priorizar investimentos em saúde, educação, infraestrutura e políticas sociais. O gasto de R$ 600 mil na contratação de um único artista é desproporcional à escassez de recursos públicos locais”, afirmou a promotora de justiça Rita de Cássia Pereira Souza, da Comarca de Santa Helena, da qual Turilândia é termo judiciário.
Na decisão, a Justiça destacou irregularidades formais. No caso do show de Zé Vaqueiro, embora o preço fosse compatível com o mercado, não houve detalhamento dos custos de infraestrutura e logística, exigido pela Lei de Licitações (Lei 14.133/2021). Para os demais artistas, sequer foram encontrados registros dos contratos no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).
Em caso de descumprimento, a decisão prevê multa diária de R$ 100 mil, aplicada pessoalmente ao prefeito e ao secretário de Cultura e Turismo. A Polícia Militar foi acionada para garantir que os shows não aconteçam.
Os artistas também foram advertidos: caso recebam valores da Prefeitura após a notificação, deverão devolver o dinheiro aos cofres públicos.
Investigação de desvio de R$ 56 milhões em Turilândia
Prefeito, vice-prefeita, ex-Vice-prefeita, empresários, servidores, vereadores e um ex-vereador do município são suspeitos de integrar um esquema de corrupção por meio de empresas criadas de forma fictícia pelo prefeito de Turilândia, Paulo Curió (União Brasil) e seus aliados .
Segundo o MP-MA, foram desviados mais de R$ 56 milhões através dessas empresas fictícias. O grupo atuava de forma hierarquizada, com divisão clara de tarefas entre agentes políticos, operadores financeiros e empresários.
Há indícios de organização criminosa, fraude à licitação, corrupção ativa e passiva, peculato e lavagem de dinheiro. As irregularidades teriam ocorrido durante a gestão do prefeito Paulo Curió, entre 2021 e 2025.
Veja abaixo como era a participação do prefeito, da vice, e de outros agentes políticos, segundo o Ministério Público. O g1 tenta contato com a defesa de todos os suspeitos, mas ainda não obteve retorno.
De acordo com a investigação, o prefeito José Paulo Dantas Silva Neto, o Paulo Curió (União Brasil), era uma liderança na organização criminosa e destinatário de grande parte dos valores desviados. No esquema, ele atuava como:
Em um dos trechos citados na decisão, o Ministério Público afirma que o esquema funcionava por meio da chamada “venda de notas fiscais”, em que empresas contratadas “emitiam notas fiscais sem a correspondente prestação de serviços, devolvendo a maior parte dos valores ao núcleo político da organização”.
Tânia Karla Cardoso Mendes Mendonça, vice-prefeita de Turilândia, aparece nos autos como integrante do núcleo empresarial e operacional da organização criminosa. Segundo o MP, ela era:
A Justiça aponta que pessoas como Tânia Mendes eram essenciais para “dar aparência de legalidade às contratações e facilitar a lavagem de capitais”. Ela não é apontada como líder, mas como peça ativa na execução prática das fraudes.
A ex-vice-prefeita Janaina Soares Lima é apontada como peça central do esquema, especialmente no núcleo empresarial. Ela teria atuado como controladora de fato do Posto Turi, empresa que mais recebeu recursos do município. Ela ainda:
Segundo os autos, diálogos interceptados mostram que Janaina tratava os valores retidos como um “imposto” dentro do esquema, além de cobrar diretamente o prefeito pela liberação de pagamentos.
Janaína e seu marido, Marlon Zerrão - que é tio da atual vice-prefeita - tiveram um papel central no desvio de recursos. O Posto Turi recebeu R$ 17.215.000,00 dos cofres públicos de Turilândia, segundo o MP-MA.
Janaína e Marlon firmaram um acordo com o prefeito Paulo Curió para reter 10% dos valores dos contratos do Posto Turi. Esse valor era destinado ao pagamento da faculdade de medicina de Janaína Lima, enquanto os 90% restantes eram entregues ao prefeito ou a quem ele indicasse.
Operação investiga desvio de mais de R$ 56 milhões e mira prefeito e vereadores no MA
Os atos de corrupção motivaram a criação da Operação Tântalo II, realizada no último dia 22 de dezembro, que levou à prisão o prefeito Paulo Curió e a vice-prefeita Tânia Mendes. A ação é um desdobramento da Operação Tântalo, realizada pelo Gaeco em fevereiro deste ano.
Além dos gestores, há empresários, servidores, 10 vereadores e um ex-vereador investigados por integrar o esquema de corrupção. Atualmente, o ex-vereador atua como secretário municipal de Agricultura.
Justiça manda prender prefeito, a vice e os 11 vereadores de cidade no MA por corrupção
Após audiência de custódia, a Justiça converteu para domiciliar as prisões dos cinco vereadores de Turilândia que se entregaram à polícia, na última quinta-feira (25), na Unidade Prisional de Pinheiro (MA). Todos são suspeitos de corrupção por desvios de R$ 56 milhões em dinheiro público. São eles:
Segundo o Ministério Público, a Justiça tem entendido que os vereadores devem ficar presos em casa durante as investigações, com uso de tornozeleira eletrônica, para que os município não fique sem comando, já que a prisão do prefeito Paulo Curió foi mantida pela Justiça.
O prefeito, a vice, e a primeira-dama foram encaminhados para o Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, e a expectativa é que o presidente da Câmara de Vereadores assuma o comando do município nos próximos dias.
Paulo Curió se entregou à polícia na manhã da última quarta (24), em São Luís, após permanecer dois dias foragido, assim como os cinco vereadores.
De acordo com o MP-MA, 21 mandados de prisão foram expedidos no âmbito da investigação. Além dos gestores, empresários, servidores, vereadores e um secretário municipal de Agricultura do município são investigados por integrar o esquema de corrupção. Com a apresentação dos cinco vereadores, todos os alvos com mandado de prisão tiveram a ordem judicial cumprida.
Promotor do MP explica por que presidente da Câmara está no comando de Turilândia
Mesmo cumprindo prisão domiciliar e sendo investigado pelo Gaeco, o presidente da Câmara Municipal de Turilândia, José Luís Araújo Diniz, conhecido como “Pelego” (União Brasil), assumiu interinamente a Prefeitura do município após decisão do (TJ-MA) que afastou o prefeito Paulo Curió (União Brasil) e a vice-prefeita Tânya Mendes (PRD) do comando do Poder Executivo.
A mudança na linha sucessória foi oficializada por meio de uma portaria publicada na sexta (26), que reconhece a vacância temporária dos cargos de prefeito e vice.
Com a ida de Pelego para o Executivo, a vice-presidente da Câmara, vereadora Inailce Nogueira Lopes, passou a exercer interinamente a presidência do Legislativo municipal.
José Luís Araújo Diniz é um dos investigados na Operação Tântalo II e cumpre prisão domiciliar. Pela decisão judicial, ele e outros vereadores investigados estão autorizados a sair de casa apenas para participar de sessões da Câmara Municipal previamente marcadas. Qualquer outra saída sem autorização pode resultar na revogação da prisão domiciliar e na transferência para uma unidade prisional.
A situação levantou questionamentos sobre a possibilidade de um vereador investigado e em prisão domiciliar assumir, ainda que de forma interina, o comando do Executivo municipal. Para esclarecer o tema, o g1 ouviu o promotor Fernando Berniz, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Maranhão, que atuou na investigação.
Segundo o promotor, a assunção interina do cargo está prevista na legislação municipal. “Pode sim. Até porque ele não está afastado das suas funções. E, de acordo com a Lei Orgânica Municipal, na ausência do prefeito e do vice, quem assume a função do Executivo é o presidente da Câmara Municipal”, explicou.
No entanto, Berniz ressaltou que a autorização judicial atualmente em vigor permite apenas o exercício das atividades no Legislativo.